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Bricolage da Escrita

Bricolage da Escrita

A propósito de um inquérito a docentes

Concordo que hoje em dia proliferam, quase desmesuradamente, as opiniões acerca da educação e do ensino em Portugal. Queixam-se, alguns, que muito se diz e não se apresentam soluções. Todos opinam e ninguém se entende, dizem outros. Todavia, eu parto sempre do princípio que é da discussão que nasce a luz e, por isso, todas as opiniões podem conter algo de positivo. Também não devemos, precipitadamente, subestimar ou menosprezar tudo o que não esteja de acordo com aquilo que nós eventualmente pensamos.

 

Vem isto a propósito de um inquérito aplicado em 130 escolas, a quase 3000 docentes do ensino publico e privado, cujos resultados foram, há alguns dias, divulgados nalguns jornais nacionais.

 

Contribuindo, então, para aumentar o número dos opinantes sobre educação e ensino, não resisto a fazer a minha análise geral ao referido inquérito.

 

Não me surpreende que os professores (uma grande percentagem) estejam desmotivados, sobretudo (conclui-se dos resultados do inquérito), por o seu trabalho não ser socialmente reconhecido (80%). E a comunicação social segundo os inquiridos (90,7%), também contribui para o desprestígio da classe docente. O próprio Ministério da Educação e Ciência (MEC) é, na opinião dos docentes respondentes (85%), igualmente responsável para o não reconhecimento do trabalho docente. Infere-se, do respetivo inquérito, que alguns problemas ao nível das crianças e alunos com quem trabalham os professores estão relacionados com a sua desmotivação e falta de acompanhamento dos pais e encarregados de educação. Outros problemas da educação destacados são, por exemplo, a extensão dos programas (30%) e falta de atenção dos alunos nas aulas. A causa também de “insatisfação” no trabalho dos docentes é a indisciplina em sala de aula (52%).

 

Chegados aqui, é caso para dizer que os resultados do inquérito (não faço referência a todos os dados), são apenas a confirmação daquilo que já se sabe há muito tempo. De forma recorrente (com inquéritos ou sem eles), as conclusões são basicamente as mesmas. Porque tardam - se os problemas estão objetivamente diagnosticados - as soluções? Por falta de vontade política? Por causa da resistência à mudança por parte de alguns docentes? Há excesso de legislação e consequente falta de autonomia das escolas? Existe falta de recursos físicos, pedagógicos e humanos? Estamos perante uma crise de identidade da escola? A culpa é da sociedade? Talvez todas as questões façam sentido para explicar, pelo menos em parte, a dificuldade em implementar novas soluções para garantir a qualidade da educação. O professor Joaquim de Azevedo aborda algumas destas questões, numa entrevista concedida, hoje, ao “JN”.

 

Por outro lado, e apesar de não ser objeto do mencionado questionário, constata-se que talvez estejamos a viver um período, em matéria de educação, focado na centralidade - a maior parte das vezes - negativista, do aluno: (i) não tem hábitos nem métodos de estudo; (ii) não é capaz de se concentrar; (iii) não sabe investigar, fazer consultas bibliográficas ou distinguir o essencial do acessório; (iv) não sabe fazer operações simples, dá erros ortográficos e tem dificuldades na expressão oral; (v) não quer saber de nada; (vi) não é educado, responsável, nem se empenha na vida da escola; (vi) é, regra geral, vítima de famílias desestruturadas ou, como também se ouve dizer, disfuncionais.

 

Para além dos motivos inerentes aos alunos para explicar a falta de performance escolar, é frequente juntar ainda outros: (i) a extensão dos programas; (ii) os conteúdos sem interesse para os alunos; (iii) as tarefas burocráticas que se exigem aos docentes; (iv) as turmas exageradamente grandes para a prática da diferenciação pedagógica; (v) a falta de autonomia das escolas… e poderíamos continuar.

 

Olhando para o panorama acima descrito – aparentemente, pelo menos - estão encontrados os fatores do insucesso (ou da falta de maior sucesso) dos nossos alunos. Só falta, na sequência da excitação de tal descoberta, e à semelhança de Arquimedes, correr nus pela rua e gritarmos: Eureka! Eureka! Eureka! Mas as razões do insucesso escolar não podem estar confinadas ou centradas exclusivamente neste ou naquele fator. Se quisermos ser realistas, todos sabemos que existe uma multiplicidade de fatores que se interpenetram, contribuindo para condicionar uma escola de sucesso mais substancial. Há que evitar, portanto, reducionismos infundados e precipitados.

 

Não tenho, pelo menos aqui, a pretensão de explorar todos os motivos alegadamente subjacentes à falta generalizada de bons resultados escolares. Isso daria, passo o exagero, um livro! De qualquer modo, gostaria de elencar alguns domínios da educação que poderão ser objeto de reflexão a fim de inverter, pelo menos um pouco, a tendência negativa e/ou negativista de que temos vindo a falar.

 

Atrevo-me, então, a avançar com algumas soluções que não são propriamente inovadoras. Algumas, de uma maneira ou outra, vão sendo ventiladas. Por mim, destaco as que me parecem mais simples (pela facilidade da sua aplicação), mas nem por isso menos importantes:

 

  • Criar uma maior exigência no acesso aos cursos orientados para a carreira docente. Entre outras medidas, dever-se-ia aumentar substancialmente a média de acesso à profissão docente. Não é assim com outros cursos?

 

  • Remunerar convenientemente os docentes e os profissionais da educação em geral (comparativamente a outros profissionais com habilitações semelhantes, têm vencimentos consideravelmente inferiores);

 

  • Criar outros mecanismos (os que estão legalmente previstos já deram provas de que são frágeis) que responsabilizem os pais, no acompanhamento do percurso escolar dos seus educandos;

 

  • Apostar no trabalho preventivo do absentismo e abandono escolares, mas também da indisciplina, criando, para o efeito, equipas multidisciplinares nas escolas (os docentes não podem ser especialistas em todas as matérias). No entanto, cada professor pode dar o seu contributo para prevenir a indisciplina em sala de aula. Como? Uma das estratégias passar por, em contexto de sala de aula, proporcionar aos seus alunos condições para libertar a sua criatividade, a sua curiosidade; permitir-lhe que sejam ativamente co-construtores da aprendizagem; ocupá-los em tarefas que os motivem e onde se sintam envolvidos. Gaston Bachelard, um filósofo francês é, a propósito, elucidativo quanto às potencialidades do aluno: “para ensinarmos um aluno a inventar precisamos de lhe mostrar que ele já possui a capacidade de descobrir.”;

 

  • Promover a pedagogia de aprender e ensinar que privilegie formas de trabalho diversificadas, sobretudo em contexto de sala de aula;

 

  • Apostar, intencional e estrategicamente, no trabalho cooperativo entre docentes dentro da sala de aula (fomentar a prática do conceito de professor colaborativo assente numa partilha regular de boas práticas);

 

  • Reduzir e proceder a reformulações dos programas curriculares, procurando torná-los consentâneos com o nível etário e interesse dos alunos, e promovendo, intencional e metodicamente, a articulação entre os conteúdos das diferentes disciplinas;

 

  • Diversificar as formas de divulgação pública por parte das escolas, dos seus projetos educativos (um modo, entre outros, de identificar os seus objetivos, iniciativas e princípios norteadores da sua ação pedagógica);

 

  • Difundir com maior regularidade nos meios de comunicação social, as experiências positivas e inovadoras que, apesar de tudo, se desenvolvem em várias escolas (o reconhecimento social da profissão docente implica que se divulgue cada vez mais o bom trabalho realizado);

 

  • Reduzir o número de alunos por turma – uma solução que não é consensual - e avaliar, objetivamente, o seu impacto na qualidade do processo de ensino e de aprendizagem e nos resultados dos alunos;

 

  • Melhorar, em todas as escolas, os recursos materiais e humanos;

 

  • Promover maiores margens de autonomia nas escolas (dar, por exemplo, às escolas a possibilidade de escolha e/ou gestão de recursos humanos para o desenvolvimento de projetos que, comprovadamente, têm fortes probabilidades de ter impacto positivo na qualidade do processo de ensino e de aprendizagem e nos resultados escolares);

 

  • Insistir na generalização de uma cultura de rigor, designadamente no planeamento, na organização e na implementação de estratégias, projetos e medidas (a liderança das escolas tem um papel determinante na internalização dessa cultura);

 

  • Investir um pouco mais na formação integral dos alunos (corresponsabilizá-los nalgumas decisões da escola, com o propósito de, ao mesmo tempo, desenvolver neles diversas competências. Não é suficiente dizer e/ou ensinar aos alunos que a liberdade e a responsabilidade são importantes. Temos que lhes dar oportunidade de as experienciar).

 

Acrescentaria, ainda, a necessidade de criar dispositivos legais que obriguem as entidades empregadoras a remunerar de forma adequada e condigna os recém-licenciados (pagar mal a quem investe tanto na educação não é bom exemplo para os alunos estarem motivados para estudar e valorizar a sua formação e educação). Além disso, contribui, com certeza, para aumentar o ceticismo dos pais e da sociedade em geral, relativamente à importância da escola.

 

Estamos, assim, perante parte de soluções possíveis. Insuficientes? Discutíveis? Muito provavelmente, sim.

 

Jota Eme

Pai, o que é a Filosofia?!

 

Confrontado com as inquietações e/ou dúvidas da minha filha face à disciplina de filosofia, por estar prestes a iniciar o 10.º ano de escolaridade, decidi tentar esclarecê-la sobre a “matéria”, digamos assim. Podia-lhe ter sugerido o “Google”! Pois, mas não o fiz.  

 

Como é natural, fez-me algumas perguntas do género: o que é, afinal, a filosofia?, do que trata?, é verdade que é muito subjetiva?, para que serve?, temos que estudar as teorias dos filósofos?, etc.  Estou convencido que esta curiosidade é comum a muitos outros colegas seus nas mesmas circunstâncias.

 

Podia ajudar-te a seres tu própria a chegar à noção de filosofia. Bastava que te fosse fazendo algumas perguntas. No entanto, vou optar por, da forma mais simples possível, tecer algumas considerações gerais.

 

Infelizmente, continua a existir uma série de ideias preconcebidas e enviesadas sobre a noção de filosofia. Antes de mais, convém lembrar que a filosofia é, à semelhança por exemplo, da física, matemática, biologia ou sociologia, um ramo do saber. Talvez em termos de similitude, poderíamos ainda ir um pouco mais longe e dizer que, tal como as ciências, tem um objeto de estudo, uma metodologia de investigação e um objetivo. No entanto, tem caraterísticas distintivas, tornando-a uma forma de saber diferente daquele tipo de conhecimento que vulgarmente apelidamos de científico.

 

Por uma questão metodológica tentei esclarecer, sucintamente, o contexto geográfico e histórico-social do aparecimento da filosofia, ao mesmo tempo que remeti para o seu significado etimológico: (philos = amor; sophia = sabedoria). Convém partir deste princípio básico: a filosofia tem origem na antiga Grécia e deriva daquele termo grego que significa, “amor ou amizade pela sabedoria”. E não é para confundir esta “sabedoria” com aquele tipo de cultura geral que é testada nos concursos televisivos. Nada disso. Tentarei, à frente, voltar a este conceito de sabedoria no seu sentido filosófico, claro.

 

Como referi anteriormente, a filosofia dispõe de um método de estudo, que não é o método experimental, como nas ciências, mas sim a reflexão crítica. E o suporte da sua metodologia, o seu instrumento privilegiado, é a razão. O conhecimento filosófico é, na sua essência, um conhecimento racional. Por outro lado, enquanto os outros ramos de saber têm um objeto de estudo específico (a física estuda e/ou aborda apenas fenómenos físicos, a biologia estudo os fenómenos biológicos …), a filosofia tem como objeto de estudo a totalidade do real. Já quanto ao objetivo, a filosofia visa, grosso modo, aprofundar o conhecimento da realidade, seja ela de natureza ética, estética, religiosa, política, existencial; numa palavra, tem como finalidade ir à raiz dos problemas (do mundo e da vida).

 

A filosofia, pela sua natureza metodológica, método de estudo e objetivo, distingue-se ainda de outras formas de conhecimento, como seja o senso comum ou o conhecimento religioso: do primeiro, porque assenta essencialmente nos sentidos, e do segundo, porque se fundamenta naquilo que comummente apelidamos de fé.

 

Temos, assim, em primeiro lugar, ainda que em sentido abstrato, os principais contornos identificativos de uma forma de conhecimento - a filosofia. É fundamental começar por aqui: saber o seu significado e do que trata. E assim, de forma elementar, tentei responder às duas primeiras questões. A outra forma de compreender a filosofia - com certeza, a melhor - é filosofando. Tal e qual. Ninguém aprende a andar de bicicleta, sabendo apenas, teoricamente, as suas principais caraterísticas.

 

Vamos agora à questão de algumas outras ideias feitas, como por exemplo: “isso da filosofia é muito subjetivo”. Não é inteiramente verdade. Claro que ao longo do tempo - nos nossos dias também - vemos vários pensadores que, sobre o mesmo assunto, apresentam ideias diferentes. Isso é verdade. De qualquer modo, se pensarmos um pouco, há um objetivo comum a todos esses filósofos: aprofundar o conhecimento da realidade. Ora, quanto a mim, aprofundar o conhecimento seja do que for (da ética, estética, política, valores, religião…), não é propriamente com a intenção de o tornar subjetivo ou de o complexificar. A intenção é, bem pelo contrário, conhecer melhor a realidade e, consequentemente, tornar o seu conhecimento mais claro e objetivo; desocultar grandes questões. E aqui reside a verdadeira sabedoria em relação à qual prometi, anteriormente, voltar a falar.

 

A verdadeira sabedoria é a consciência permanente de que não sabemos nada no sentido absoluto; de que não há um conhecimento único e definitivo. Por isso, a dúvida (a chamada dúvida metódica) surge como método de conhecimento da filosofia. Não se trata de duvidar por duvidar, mas da dúvida enquanto método de reflexão crítica, de questionamento, de procura da verdade. Só há disponibilidade e/ou predisposição para sabermos mais, se admitirmos que nunca sabemos tudo; se assumirmos aquilo que já o filósofo da antiguidade grega, Sócrates, chamou de “douta ignorância” ou sábia ignorância; se estivermos dispostos a perguntar pelos fundamentos daquilo que nos rodeia; se não quisermos fazer parte do rebanho conformado e conformista. A propósito, o filósofo Kierkegaard terá dito: “ a multidão não é de fiar”.

 

Amor pela sabedoria é, portanto, a busca da verdade através da reflexão crítica; da procura de respostas às nossas dúvidas sobre a vida e sobre o mundo, no sentido de aprofundar o seu conhecimento. E para que tal aconteça temos, em primeiro lugar, de questionar e de nos questionarmos. Não é por acaso que também se diz que a filosofia tem origem numa atitude de espanto, de admiração perante o que nos rodeia. E os filósofos, neste particular, são um exemplo paradigmático. Por isso, um pouco de estudo da história da filosofia também é necessária, pedagógica. Ler e analisar os seus textos, para além de te ajudar a conhecê-los melhor, desenvolves, entre outras capacidades, o teu espírito crítico. Útil, portanto.

 

Ora, para que serve, então, a filosofia? É uma questão legítima. No entanto, por vezes, os pretensos pragmáticos, concretamente os aduladores da ciência, colocam a mesma questão numa atitude de desdém e de inusitada superioridade intelectual em relação ao conhecimento filosófico. Claro que numa sociedade pautada pelos resultados imediatistas, a filosofia é vista, no mínimo, com desconfiança. Habituados que estamos a tomar como único critério de utilidade o que nos pode dar resultados palpáveis a curto prazo, mas também a tomar o conhecimento científico como único e verdadeiro, a filosofia não sai bem na fotografia, digamos. Ora, os conceitos de utilidade e de verdade merecem sempre alguns cuidados de análise, sob pena de cairmos numa espécie de atitude reducionista ou dogmática. E a filosofia é, no essencial, antidogmática. Sobretudo porque, para ela, não existem verdades absolutas. E nisso se distingue também da religião.

 

A utilidade da filosofia reside na possibilidade que dá a cada um de pensar crítica e fundamentadamente a sua ação com o intuito de agir melhor quer em relação a si, quer em relação àqueles que o rodeiam. Para além do apelo que faz a que seja cada um de nós a tentar refletir a sua vida, o seu significado, a encontrar soluções para os seus problemas, a filosofia induz também à reflexão individual sobre o significado do mundo no seu sentido mais amplo. A filosofia é, deste modo, um projeto existencial; a procura permanente de respostas a duas perguntas vitais para o ser humano: “porquê e “para quê”. Em última instância é uma prática de vida sustentada na verdadeira liberdade de escolha.

 

Os filósofos, de um modo geral, ao aprofundar o conhecimento, construíram ideias para serem (eventualmente) utilizadas: por eles próprios e pelos outros. Se refletirmos de forma interrogativa, com certeza que podemos encontrar e/ou construir as nossas ideias; agir em conformidade com o nosso pensamento, em vez de seguirmos cega e irrefletidamente o que os outros dizem ou pensam. Relembremos a já citada sábia frase do filósofo: a multidão não é de fiar. Portanto, a utilidade da filosofia reside, afinal, na possibilidade de procuramos, por nós próprios, o significado do nosso projeto de vida e do mundo; participar ativamente nele. Por isso, contrariamente ao que muitos pensam, a filosofia não deve ser confundida com uma espécie de saber contemplativo ou meramente especulativo. Nada disso. E porque exige que pensemos por nós próprios, numa atitude crítica, interrogativa, inconformista, a filosofia, nos dias de hoje, não se afigura fácil, nem uma tarefa imediatamente prazenteira. Num mundo que nos criou a ilusão de ter respostas para tudo, talvez tivéssemos perdido um pouco a capacidade de nos surpreender com aquilo que nos rodeia e, consequentemente, a aptidão para o questionamento. Como diria Aristóteles, Os homens começam e sempre começaram a filosofar movidos pela admiração.

 

Já sobre a sobrevalorização do conhecimento científico em detrimento de outras formas de conhecer, como a filosofia, por exemplo, isso decorre essencialmente de quatro motivos: (i) da sua maior divulgação pública; (ii) da necessidade de apresentar resultados imediatos; (iii) da convicção (infundamentada) de que detém a exclusividade do conhecimento verdadeiro; (iv) de algum provincianismo no modo de compreender o significado e alcance da filosofia. São motivos razoavelmente fáceis de contrariar. Como se sabe, o que ontem era considerado cientificamente válido, deixou, decorrido algum tempo, de o ser. Por outro lado, a ciência tem limites. Compete à filosofia refletir sobre os limites do conhecimento científico, designadamente de natureza ética. E existem, na atualidade, filósofos que têm essa preocupação.

 

A filosofia foi, durante séculos, a forma de conhecimento dominante da humanidade. Inclusivamente, ao longo do tempo, houve grandes filósofos que foram matemáticos, físicos e biólogos… Hoje, a filosofia continua, pela natureza do seu objeto de estudo (a totalidade do real), a fazer pontes entre os diferentes ramos do saber. Talvez seja a única forma de saber que promove, verdadeiramente, a interdisciplinaridade: a interpenetração e interdependência entre os diferentes ramos de conhecimento, dando-nos uma visão mais aprofundada e coerente da realidade. Também por aqui podes aquilatar da sua utilidade.

 

Por fim, queria ainda dizer-te que, independentemente da profissão que vieres a escolher, espero que procures a sabedoria no sentido filosófico: que respeites a opinião do outro, mas não abdicando de pensar sempre por ti; que não te deixes arrastar pelo rebanho, mas que questiones, interrogues e faças uso da dúvida metódica; que não te tornes dogmática na forma de encarar o mundo e a vida; que não te deixes guiar por supostas verdades absolutas; que encares o conceito de utilidade numa perspetiva abrangente; que aprendas a “espantar-te” com o que te rodeia; que busques sempre os fundamentos da realidade (física e humana).

 

Acredita que a filosofia é tão importante como as outras disciplinas, sejam elas a matemática, a economia ou outra qualquer. Ouves, com alguma frequência, falar da corrupção de diversos governos, de escândalos financeiros, de falência de grandes empresas, mas também da ausência de políticas sociais mais justas em vários países. Por vezes, isso resulta também (não só, claro) da falta de formação de cariz filosófico de alguns homens (banqueiros, empresários, gestores, políticos…) que descuraram valores fundamentais. Talvez nunca tiveram o prazer e a felicidade de aprender a refletir criticamente; nunca se empenharam em procurar a verdade; acreditaram obcecadamente nos valores materiais, como o do lucro imediato; foram escravos do “utilitarismo” do dinheiro; desprezaram a justiça e o bem. Estavam ou estão convencidos de que são os arautos da verdade única e absoluta, alicerçada na sua formação científica e técnica. Mas, como vês, isso pode não ser suficiente: falta-lhes, afinal, a verdadeira sabedoria, outra forma de interpelar a realidade.

 

Minha filha, muito mais teria a dizer-te sobre a filosofia. No entanto, a forma de melhor a compreender e dela gostar é, como já te disse, filosofando. Porque filosofar é também viver de forma mais autêntica.

 

JOTA EME

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